A paz que cura nossas ansiedades

Nossa geração vive em tempos de inquietação, de ansiedades e tristezas profundas que se alastram e tomam-nos o brilho e a paz. Falo por experiência: também eu já estive imersa nessa incerteza e escuridão, e sei que quando estamos nesse estado, sentimos que nunca seremos capazes de sair. Mas, é claro, isso não é verdade. A minha falta de fé antes não me permitia enxergar algo que hoje declaro como realidade: o Amor cura todas as feridas. Sejam as da alma, as do corpo, as da mente… quando chega o Amor, a escuridão já não tem mais lugar.
Com isso não digo que a vida torna-se perfeita na nossa perspectiva humana – mesmo porque nossas definições de perfeição estão longe de serem precisas. Digo que, quando amamos, toda dor passa a ser insignificante. Nos traz conforto e paz ter a certeza de que estamos unidos Àquele que nada de mau merecia, mas tudo sofreu, porque Seu Reino não era dessa Terra. Assim também o nosso Reino, como filhos desse Rei, não é dessa Terra. O mesmo caminho que seguiu o Pai, seguem também os filhos, e esse caminho embora tenha sido de cruz, transbordou amor e felicidade eterna no final.
Se temos em nosso coração somente o desejo de amar a Cristo e nada mais aspiramos nessa vida além dEle, não há nada na Terra que possa nos tirar a paz. Quando Ele é o nosso amor e confiança e não buscamos realizar nossos próprios desejos, mas os dEle, temos a certeza de que tudo correrá da forma que precisa correr, visto que nada acontece sem a Sua permissão. Não importa o tamanho do problema se temos a certeza que nosso Deus é maior. Sabemos que as adversidades da vida nos aproximam do Céu, e aspiramos poder ter mais cruzes para que mais possamos sofrer unidos a esse Amor.

“O caminho da cruz é o que Deus reserva aos seus escolhidos: quanto mais os ama, mais os sobrecarrega de tribulações”

Santa Teresa D’Ávila

Toda vez que rezamos o Pai Nosso, dizemos: seja feita a Vossa vontade assim na Terra como no Céu. Mas dizemos da boca pra fora se não estamos completamente desprendidos e abandonados na confiança de que, seja lá qual for a vontade desse bondoso Mestre, será o melhor para nós. É extraordinário pensarmos que a Terra pode ser como o céu; onde os anjos e santos servem a tão grandioso Senhor e Ele reina entre os seus. Imagina se nossas vidas pudessem também ser assim!
Em vez de temermos confiar na vontade de tal Mestre, deveríamos temer intensamente seguir nossas próprias vontades tolas. Se não confio no Senhor, é esperado que fique ansiosa e perca a minha paz nas coisas mais banais, porque não tenho comigo a certeza de um Deus onipotente que cuida dos meus problemas. Que vida infeliz! Tiro de mim mesma a paz e o silêncio pela minha falta de confiança, e torna-se impossível me aproximar dEle se a minha mente está assim tão inquieta. Se confio em mim mesma ou em nada confio, tenho muitos motivos para me deixarem ansiosa, visto que a minha vida passa a se basear na sorte do mundo e nas probabilidades, e estas dificilmente acertam em alguma coisa. Se, no entanto, confio em Deus, sou liberta de qualquer preocupação terrestre, porque sei que Sua Majestade não pode nunca falhar.

“O que Lhe agrada é me ver amar a minha pequenez e a minha pobreza, é a esperança cega que deposito na sua misericórdia… Eis aí o meu único tesouro. Madrinha querida, por que não seria vosso também este tesouro?”

Santa Teresinha do Menino Jesus

Confio, então, que seja lá o que acontecer na minha vida, foi permitido pelo Rei. E se foi permitido por Ele, como posso me preocupar? Me preocuparia se soubesse que não foi de acordo com a Sua vontade, mas a minha. Aí, sim, teria muito o que me preocupar, já que eu vejo apenas uma pequena parcela da vida, tenho desejos e impulsos corruptos e imaturos e claramente não sei o que é melhor para mim mesma. Mas o grandioso Deus do Céu e da Terra, em Sua infinita sabedoria, sabe de todas as coisas. Se confio nessa verdade e nela me abandono, ganho a paz de espírito que anseio, pois sei que tudo terminará como precisa terminar.
Temos a certeza de que se o bom Deus nos permite sofrer é pelo benefício de nossas almas, e se a salvação destas é o nosso mais ardente desejo, o que nos ajudar a realizá-lo será sempre bem-vindo. Melhor ainda será se amarmos as dificuldades da vida por saber que foram permitidas por Pai tão amoroso, que não quer nada além do melhor para nós. Esse melhor pode vir de forma incompreensível pelo ser humano, mas no plano divino tudo tem uma razão.
Infelizmente dificilmente terão paz aqueles que estão interessados em prazeres ou alegrias passageiras, ou em satisfazer seus próprios desejos, ou em possuir conquistas e tesouros, ou em serem amados e admirados pelas criaturas etc. O próprio Deus quando se encarnou como homem não teve nenhuma dessas coisas, nem tampouco as quis. Também nos avisou que o mundo nos trataria da mesma forma com que foi tratado, e Ele se revela aos que aceitam e amam essa realidade, por serem considerados dignos de viver como o próprio Deus viveu.

O abandono à Vontade de Deus é o segredo para sermos felizes na terra. A aceitação rendida da Vontade de Deus traz necessariamente a alegria e a paz: a felicidade na Cruz. – Então se vê que o jugo de Cristo é suave e que o seu fardo não é pesado.

São Josemaría Escrivá, em Caminho

Por não confiar em Deus, nos apressamos a resolver os nossos problemas e a achar respostas para a vida sozinhos, porque não acreditamos que Ele virá. A pobre alma é inundada por tormentos terrestres e, estando assim tão convencida e ensurdecida por suas próprias preocupações, não consegue encontrar o silêncio e a confiança para olhar dentro de si e enxergar o que estava fora dos trilhos já desde o início. Muitos se desesperam e começam a desconfiar de Deus por tempestades que eles mesmos criaram. Até chegar o dia em que finalmente se rendem e fazem o que precisavam ter feito no início – e constantemente após: uma análise interior. E esta é feita ao nos despirmos em frente a um espelho espiritual e olharmos para as nossas próprias feridas, para as nossas imperfeições e para todas as áreas onde o Senhor precisa tocar. E, pelo silêncio e pela oração, entramos nesse Castelo interior que é a nossa alma, e finalmente podemos desenvolver um relacionamento de amor com Aquele que é o Deus que cura nossas ansiedades.
Entregando-nos completamente à Sua misericórdia como os filhinhos que se jogam livremente nos braços dos pais, sem medo do que acontecerá e confiando que serão resgatados, encontramos a paz. As preocupações terrestres já não são capazes de nos perturbar; não somos mais insistentes em querer que as coisas ocorram à nossa maneira, porque sabemos que a de Deus será sempre melhor. A confiança cega na infinita sabedoria do nosso Rei e o desinteresse de tudo o que essa Terra pode nos oferecer é o remédio para toda a agonia que atraímos para nós mesmos. Quando não desejamos nada senão o Majestoso Deus, somos surpreendidos por Seu vasto amor, infinitamente maior do que poderíamos imaginar.

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